01/01 (Mônica Grivor): Extermínio Dos Cabelos De Sol

CAP 01 | Extermínio Dos Cabelos De Sol

Um novo amanhecer começa num planeta muito distante. Os primeiros raios de luz, de um Sol vermelho como o sangue, adentram pelas folhas das árvores de uma floresta esquecida e tocam os vidros da janela de uma imensa casa. A residência, que mais parece uma hospedaria, é o lar de uma única vampira. Apesar do lugar afastado de tudo, a casa é muito bem cuidada e tem um estilo similar ao das construções medievais antigas.

Num dos quartos, uma linda jovem abre os olhos, mas se recusa a sair da cama. Ainda enrolada nas cobertas, ela reclama com as paredes.

- Que coisa chata! Eu tô atrasada de novo para o trabalho. Isso nunca muda. A cidade bem que podia ser mais perto daqui.

Longe da floresta, a exuberante, forte e magnifica Cidade-Estado Medieval de Grafar está desperta e cheia de vida circulando pelas ruas. O lugar é repleto de flores pelas calçadas, há diversos chafarizes de prata espalhados por praças públicas e pequenos balões mágicos exalam suaves fragrâncias pelo ambiente. As casas possuem telhados dourados, os vidros são feitos de cristais belíssimos e as pinturas das fachadas são, geralmente, na cor branca, amarela ou prata. Nesse ambiente harmonioso, coelhinhos fofinhos correm pelas ruas em meio a charretes puxadas por majestosos corcéis negros. Um vampiro que chegue em Grafar pela primeira vez e não conheça a história do lugar é incapaz de imaginar que essa mesma cidade, pacata e tranquila, há 2000 anos atrás, cheirava a ferro e sangue. Naquela época, durante o período da grande e terrível caçada aos Cabelos de Sol, gritos e urros de dor eram ecoados incessantemente nas praças e avenidas.

Na casa da floresta, Mônica está escovando os dentes com uma mão e ajeitando os óculos fundo de garrafa com a outra. Os cabelos vermelhos estão bagunçados e esperando para serem penteados. Após cuspir o creme dental da boca e erguer a cabeça, ela olha o reflexo do próprio rosto no espelho e contempla os fios escarlates que caem sobre a testa.

“Falta pouco ... Falta bem pouco ...”

Por mais que o tempo tenha passado, Mônica se lembra, todos os dias, de como era a vida antes daquele capítulo obscuro que ocorreu na cidade de Grafar. Num tempo extremamente remoto, no qual existia um clã de vampiros com cabelos vermelhos. Eles eram conhecidos como Cabelos de Sol, pois o vermelho dos fios era tão intenso e forte quanto a cor do Sol do planeta deles. A jovem recorda que, naquela época, todos os clãs viviam em harmonia.

Após pentear o cabelo, ela caminha pelo corredor do segundo andar e para em frente a um quarto que, outrora, já foi uma sala de aula. Escorrendo uma lágrima pelo rosto, Mônica parece se ver no passado. Ela lembra de, naquele cômodo, assistir uma aula ministrada por uma professora com longas tranças vermelhas. A mulher usava os óculos fundo de garrafa que, no presente, Mônica ajeitava no rosto. Perdidas nas recordações, é como se a "jovem" pudesse escutar tudo novamente.

- Classe! Com relação aos Cabelos de Sol, os vampiros de cabelos vermelhos são os únicos que conseguem usar magia de fato. Em todos os países e nações desse planeta, em regra, todos os vampiros são imortais. Grafar é uma cidade mais isolada e muitos de vocês ainda não saíram para explorar o mundo. Essa aula é um guia de sobrevivência para vocês, por isso gravem, com atenção, tudo que vou falar. Não conhecemos outra espécie bípede além da nossa, mas alguns estudos sugerem a possibilidade de vida em outros pontos do universo. Os vampiros se alimentam uns dos outros ou de animais que nascem na natureza. Dependendo dos tipos de seres consumidos, isso define as habilidades de cada clã, que são diferenciados pelas cores dos cabelos. Desde os tempos iniciais desse mundo, cada “raça” convive em clima de paz armada, pois cada uma busca aumentar seu número. Tradicionalmente, em nossa sociedade não existem famílias de sangue, tal como vemos nas espécies inferiores. O mais comum são agrupamentos em interesses e afiliações, pois gestações e nascimentos só ocorrem com uso de magia.

- Professora! Meus pais têm cabelo azul, mas eu nasci com cabelo vermelho. Como isso é possível?

- Você já percebeu que o tipo de sangue que seus pais ingerem causa vômitos e náuseas para você. O inverso também é verdadeiro. Dessa forma, um vampiro nunca muda de clã simplesmente por mudar o modo de alimentação. Ele precisa ser mordido por um outro vampiro de cor de cabelo diferente. Após a drenagem de todo sangue, durante o processo de recuperação, os fios mudam de cor é ocorre uma mudança nas habilidades do indivíduo. Para você nascer, seus pais precisaram virar cabelos vermelhos. Como isso depende de uma autorização do governo central, após o nascimento, eles voltaram a ser vampiros de cabelo azul. No seu documento de registro, consta a data em que você deverá optar entre o clã da sua família ou permanecer como um cabelo de Sol.

Após essa explicação, uma pequena menina ruiva pergunta algo que não deveria.

- Professora! E isso não pode dar problema?

Ao se lembrar dessa pequena garotinha, Mônica se força para sair das recordações históricas que giravam em torno das análises das dinâmicas sociais que movem as engrenagens daquele mundo. Após dar um tapa no rosto, ela reclama consigo mesma.

- Droga! Toda vez que eu paro aqui, lembro daquele maldito dia. Nisso, toda vez me atraso.

Algum tempo depois, no meio de uma das lindas e magníficas ruas de Grafar, Mônica corre contra o tempo. Toda desajeitada e igual uma tonta sem rumo, ela tropeça pelas pedras enquanto carrega vários embrulhos para levar até a Guilda Vespas de Ferro. Ela, a única improvável sobrevivente do massacre dos cabelos de Sol, há mais de 2000 anos, esconde a linhagem genealógica a qual ela pertence. Usando magia para mudar a cor do cabelo, todos acreditam que Mônica Grifor é uma vampira de cabelo prata, um clã desprestigiado e desrespeitado naquele mundo.

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